Congresso Mundial da IUAES – Florianópolis, julho de 2018
Painel aberto 145 - Substâncias psicoativas: o encontro de múltiplos saberes e práticas na construção do conhecimento antropológico
Sessões 01 e 02 – Usos rituais e religiosos de psicoativos e alguns de seus desdobramentos (segunda), das 10:30 às 12:00
Debatedora: Camila de Pieri Benedito
O processo de consentimento livre e esclarecido no uso religioso/ritualístico da ayahuasca: importância, contextos e prática
Autores: Luis Felipe Siqueira Valêncio, Maria Silvia de Moraes, Kazuo Kawano Nagamine/ Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto, Brasil
A diáspora do uso religioso/ritualístico da ayahuasca (bebida psicoativa originária da região amazônica) proporcionou um diverso contexto de práticas, costumes, e cosmovisões dentre os grupos que utilizam a bebida. Diante desta diversidade, torna- se importante compreender quais são as concepções sobre o consentimento livre e esclarecido destes diferentes grupos, bem como de quais maneiras e com quais finalidades é realizado, tendo em vista seu valor para a segurança e minimização de possíveis danos à saúde e integridade dos participantes. Usualmente, os grupos designam membros mais experientes para orientar as pessoas que desejam consumir a ayahuasca pela primeira vez. Nesta ocasião, são passadas informações sobre o histórico de uso da bebida, efeitos, contraindicações, e informações relacionadas à prática ritual. Também é comum que uma anamnese seja realizada, onde informações sobre hábitos e saúde são solicitadas, para viabilizar a tomada de decisão do dirigente/líder/responsável sobre o fornecimento da bebida. Contudo, a fundamentação teórica bioética dos estudos sobre consentimento têm início na Ética em Pesquisa/Ética Biomédica, o que impossibilita sua aplicação acrítica ao fenômeno do consumo da ayahuasca, sendo necessária a inclusão dos saberes, particularidades e necessidades dos grupos que utilizam a bebida, buscando evitar a “colonização científica” e um “redutivismo normativo” que não dialogue com a lógica interna destes grupos.
Palavras-chave: ayahuasca; bioética; consentimento livre e esclarecido; redução de danos.
A natureza como expressão do feminino em duas comunidades do Santo Daime: Notas comparativas Brasil/Estados Unidos
Autora: Camila de Pieri Benedito/ Universidade Federal de São Carlos, Brasil
A apresentação nasce de meu projeto de doutoramento e engloba um período de Estágio Doutoral nos Estados Unidos. Através da imersão etnográfica em duas comunidades do Santo Daime (uma do Sul de Minas Gerais e outra da costa Oeste dos EUA), a investigação explora como gênero e religião se articulam na interpretação nativa dos conceitos de “feminino” e de “masculino”, elaborando cosmologias específicas que repercutem na organização social das comunidades. Neste painel é apresentada uma face específica da pesquisa: a de como natureza e feminino aparecem na cosmologia dessas duas comunidades como uma mesma coisa: o feminino sagrado, que é expressão da Virgem da Conceição. Essa elaboração é observada primeiramente por uma linha histórica, que parte da fundação do Santo Daime nos anos 1930 até sua expansão para além dos limites amazônicos e brasileiros entre os anos 1970 e 1980, com profunda transformação demográfica no culto. Em seguida, tal movimento é relacionado com outro: o da contracultura, com o desenvolvimento da espiritualidade nova era e da ecologia, que elaboram uma interpretação da natureza como sagrada. Por fim, a análise se costura através dos dados de campo e da consideração das diferenças culturais entre os países. Perspectivas teórico-metodológicas que auxiliam na análise são as da bibliografia especializada sobre religiões ayahuasqueiras, contracultura, gênero e religião e movimento nova era no Brasil e nos Estados Unidos.
Palavras-chave: Santo Daime; religiões ayahuasqueiras; feminino; ecologia.
Sessão 03 – Questões e tensões em torno do “tratamento”: comunidades terapêuticas e outras práticas
17/07 (terça feira), das 8:30 às 10:00
Debatedor: Frederico Policarpo Mendonça Filho
Os processos de transformação subjetiva em comunidades terapêuticas: tensionamentos a partir de três experiências de trabalho de campo
Autor: Jardel Fischer Loeck/ Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Brasil
A presente proposta é baseada em trabalho de campo etnográfico desenvolvido em três diferentes Comunidades Terapêuticas (CT) no Brasil, entre os anos de 2015 e 2016, como etapa da pesquisa intitulada “Comunidades Terapêuticas no Brasil: contribuições etnográficas”, executada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e financiada pela Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (SENAD). As CT são dispositivos de tratamento de usuários considerados abusadores ou dependentes de substâncias psicoativas que visam a transformação comportamental e/ou subjetiva dos pacientes em busca da abstinência total. São tratamentos normalmente de longa duração, com os pacientes residindo na instituição por meses para cumprir o programa terapêutico. Nessas instituições normalmente são aplicados um conjunto de técnicas consideradas terapêuticas que incluem práticas de espiritualidade, atividades laborais e, idealmente, atendimento com profissionais da saúde e assistência social. Cria-se assim um ambiente coletivo e com o cotidiano altamente ritualizado, povoado por indivíduos que supostamente compartilham de uma mesma condição, e que devem espelhar uns aos outros no processo de transformação subjetiva intencionado pelas instituições. Tais práticas, invariavelmente, enunciam discursos sobre o indivíduo no passado (doente/adicto na ativa), no presente (doente/adicto em recuperação) e no futuro (abstêmio). Proponho apresentar algumas situações observadas durante os períodos em campo para ilustrar como esses processos de transformação subjetiva são articulados empiricamente e como não são isentos de tensões. Em primeiro lugar, pretendo ressaltar algumas particularidades de cada uma das CT pesquisadas, demonstrando que não se pode interpretá-las como um fenômeno homogêneo. Além das diferenças relacionadas aos recursos materiais disponíveis em cada local, pode-se apontar outras que dizem respeito a uma configuração mais religiosa-espiritual ou mais técnico-científica – os limites são porosos – no que toca às práticas e discursos sobre o uso de substâncias psicoativas e sobre os usuários destas, assim como das intervenções terapêuticas. Esta fluidez acaba por gerar discursos e práticas normalmente moralizantes a respeito dos indivíduos em tratamento. Buscarei ainda demonstrar a partir de situações experienciadas em campo que a questão da coletividade criada nesses ambientes, e a pressão que esta pode exercer sobre os indivíduos, é tão ou mais importante para os processos de transformação subjetiva de pacientes que os discursos e práticas religiosas-espirituais e/ou técnico-científicas por si mesmos.
Palavras-chave: comunidades terapêuticas; etnografia; dependência química; tratamento.
Mapping and institutional dimension of Therapeutic Communities in a state of Brazil
Autoras: Priscila Farfan Barroso e Daniela Riva Knauth/ Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil
This study identifies the strategies used by representatives of Therapeutic Communities (TCs) to make this model of treatment one of the possibilities offered to drug users by the actions of Brazilian public policies. Based on Bourdieu’s notion of field (2004), we analyze the participation and organization of TCs in the political arena that discusses drug policies. To do so, we researched the ethnography of a state in Brazil with the collaboration of TC federations, Drug Policy Councils and the state’s Department of Health. In the councils, TCs take up the openings destined to the representation of the civil society. As counselors, they access public policies and fight for propositions that benefit their institutions and TC model. TC federations take action through meetings and courses, as well as through participation in hearings, conferences and forums with government representatives, seeking partnership and support for their actions in the State. And despite being granted room in public policies through the State’s purchase of slots, there’s consistent pressure for these institutions to adjust themselves and become part of the Brazilian Unified Health System (SUS). Das and Poole (2004) remind us that the State is an incomplete project and that participating in these margins allows us to act, in fact, as State. Hence, it is inferred that TCs representatives model their learning in the political arena, accessing and changing the rules of the public policies game.
Palavras-chave: drug policies; mental health; private institutions; public financing.
The use of indigenous therapeutic resources and practices in the construction of an alternative treatment of drug addictions: the case of Takiwasi
Autora: Marielena Francke/ Pontifícia Universidad Católica del Peru, Peru
Historically, Latin America has had a long history of encounters between Western and indigenous medical traditions: there have been processes of hybridization of medical knowledge, interests from groups of influence to eradicate traditional medical practices and technologies, as well as efforts to revalue them and promote collaboration between different medical systems. In Takiwasi, a rehabilitation center located in the city of Tarapoto, in the Peruvian lowlands, an unconventional healthcare method has been implemented, which uses both indigenous therapeutic resources and biomedical practices. Although the case of Takiwasi has been widely documented (particularly around ayahuasca and its therapeutic potential), there is almost no research from medical anthropology that studies the treatment as a whole. Thus, based on the study of Takiwasi’s case, this research based on a three-month fieldwork in the rehabilitation center analyzes the way in which alternative medicine carries out processes of incorporation of practices, knowledge and indigenous therapeutic resources. This also allows us to reflect on the processes of circulation and exchange of indigenous medicine in the contemporary, global setting we have today; as well as the negotiations and power dynamics that present themselves in these scenarios.
Palavras-chave: drug addiction; indigenous medicine; alternative medicine; circulation ad exchange of knowledge.
Healing “in the place of origins:” ayahuasca, anamnesis, and anthropocenic futures in Porto Velho, Rondonia
Autor: Zach Levine/ Duke University, United States
This paper emerges from long-term ethnographic fieldwork in Porto Velho, Rondônia with neo-ayahuasquero (Labate 2004) and Santo Daime groups as well as a prisoner rights NGO known as Acuda, whose mindbody therapeutic work with inmates has included extramural trips to a Santo Daime sanctuary. In the wake of the epistemic and material alienation of the long 20th century (deforestation, urbanization, and the era of the seringal), Porto Velho now hosts a labyrinthine but dense “molecular” network of healing (Guattari & Rolnik 2007)—a “spiritual infrastructure,” as I refer to it. Across this network, my ethnographic fieldwork has sought to understand how the ubiquitous discourse of ‘cura’ is thought as a somatic and psychological technology of individual and collective return, or restoration. Reforestation (within privatized tracts of forest called “chakras”), ayahuasca based mystical revival (in vegetalist traditions of plant medicine), and restorative justice (in Acuda’s work) seek dwelling, in anthropologist Rosalind Morris’ phrase, “in the place of origins,” ritually performing an irrecoverable site before deforestation, spiritual alienation, and criminal violence. The paper thus proposes a Derridean approach to diverse plant-healing communities in Porto Velho as a way of tracking emerging connections between so called ‘psychosynthesis’, memory, and mediumship in the Brazilian Amazon’s most deforested state. Alongside ethnographic evidence, the paper explores a literary and plant sensorial approach to memory stored in “codes that command the dimensional deployment of our bioelectric body” (Ayahuasca Manifesto 2011). It concludes by asking how, in Porto Velho—a city in anthropocenic ruins—the problem of the origin may be resolved or rather referred onto the body as a site of anamnesis and of wonder, recalling Perlongher’s (1997) suggestion that ayahuasca's alchemy of human and plant beings reveals “mysticism [a]s centrally corporeal” (see Baigorria 2012).
Palavras-chave: healing; ayahuasca; anamnesis; restoration.
Sessão 04: Políticas de drogas, antropologia dos medicamentos e outras questões
17/07 (terça feira), das 10:30 as 12:00
Debatedor: Jardel Fischer Loeck
Drugs and/or medications: Visions and controversies on benzodiazepines in Uruguay, between medical and nonmedical discourses
Autores: Andrea Bielli, María Pilar Bacci Mañaricua, Gabriela Bruno Cámares, Santiago Navarro, Nancy Calisto, Lauren Predebon/ Universidad de la República, Uruguay
The results of two research projects are presented in which the uses, experiences and meanings attributed to the prescription and consumption of benzodiazepines in Uruguay were investigated, based on in depth interviews and discussion groups with medical professionals and consumers of these drugs. The analysis of the case of benzodiazepines offers the possibility of showing the singularities of practices, conflicts and knowledge that revolve around a psychoactive substance that can be accessed via medical prescription, directly in pharmacies without a prescription, or by illegal means. This being so, it constitutes an exemplary case to analyze the limits of the medical understanding of drug use, even when it is prescribed as a medicine, since the uses and meanings attributed by consumers conflict with those held by physicians. In fact, different tensions were observed around the visions of the benzodiazepines, sometimes seen as dangerous drugs that generate addiction, and others as a magic medicine that relieves suffering. Particularly illustrative of these conflicts are the metaphors that appear in the discourse of the interviewees.
Palavras-chave: benzodiazepines; legal drugs; drug use; psychiatric drugs.
Antropologia e medicamentos: um olhar etnográfico sobre o trabalho dos representantes farmacêuticos
Autor: Rogério Lopes Azize/ Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Brasil
Partindo da hipótese de um “dispositivo da droga” (Vargas, 2008), ou seja, de que paralelamente a um agressivo proibicionismo, algumas sociedades ocidentais contemporâneas tendem a uma igualmente marcante incitação ao uso de certas substâncias, o objetivo deste paper é uma reflexão sobre a profissão de representante farmacêutico, um exército que excede hoje no Brasil o número de 20.000 pessoas.Refiro-me a profissionais empregados por indústrias farmacêuticas para divulgar os seus produtos diretamente aos profissionais habilitados a prescrevê-los, os médicos. Com raras exceções (Oldani, 2002, 2004, 2009; Azize, 2010), temos aí um silêncio na produção antropológica, que se debruça sobre aspectos mais visíveis do marketing farmacêutico, como a publicidade, mas cita apenas de passagem os representantes farmacêuticos, como sublinham em texto clássico Van der Geest et al (1996). No entanto, temos aí exército de vendedores que se tornou parte da paisagem urbana: são presença certa em salas de espera de consultórios médicos e podem ser divisados nas ruas de qualquer cidade, desde que se aprenda a identificá-los. Ainda assim, trata-se de uma profissão cujas práticas são pouco conhecidas, mas não pouco importantes, se pensarmos na influência potencial de seu trabalho nas práticas de prescrição médica e, consequentemente, na saúde da população.
Apresento aqui primeiros resultados de uma pesquisa que visa etnografar este aspecto da circulação de drogas através de diversos frontes: análise da literatura disponível em português sobre marketing e vendas farmacêuticas; entrevistas semiestruturadas com profissionais e exprofissionais da área; análise do processo de formação de um profissional.Trata-se também de refletir sobre o estatuto ambíguo das drogas e seus mercados, pensando certas partilhas morais: enquanto se pode identificar uma critica crescente à proibição de substâncias consideradas ilegais, o mesmo não se passa quando olhamos para remédios, cujo uso soa ser menos relacionado a uma escolha autônoma, e a literatura tende a uma crítica que demoniza a indústria de fármacos.
Palavras-chave: substâncias; drogas e medicamentos; representantes farmacêuticos.
A Policia Militar do Estado do Rio de Janeiro e uma das suas técnicas de investigacão o X9
Autora: Perla Alves/ Universidade Federal Fluminense, Brasil
O trabalho discute uma das técnicas de investigação, exercida pelos policiais militares, que é a utilização do “X9”, visto como uma “relação de parceria” com os informantes. Além de apresentar um esforço de compreensão acerca das moralidades que estão envolvidas quando o policial militar aborda o usuário de drogas e não o conduz para a delegacia a fim de fazer o registro. Além disso, após a implantação da lei 11.343/06 percebeu-se um maior número de registros nas delegacias em relação ao tráfico e uma redução no que tange os registros de posse e uso, que caracteriza usuários. Contudo, a diminuição nos números de registros não significa dizer que as abordagens, realizadas pelos policias militares aos usuários de drogas tenha sido reduzida, já que os procedimentos criminais continuam os mesmos.
Palavras-chave: abordagem policial; usuário de drogas; “X-9”; investigação.
Mães pela vida e o fim da “Guerra às drogas”
Autora: Monique Prado/ Universidade Federal Fluminense, Brasil
Este artigo descreve e analisa os discursos, articulações e debates políticos desenvolvidos durante uma audiência pública que ocorreu em maio de 2017 na Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro cujo tema era “Políticas de drogas e seus impactos na segurança pública do Rio de Janeiro”. A proposta é analisar os impactos do paradigma médico-jurídico a que a lei de drogas brasileira está submetida, através da análise das falas de alguns convidados e do debate gerado ao fim da audiência. Em que dois posicionamentos distintos ficaram em perspectiva: o das famílias, em especial das mães que tiveram seus filhos assassinados ou brutalmente feridos durante operações policiais nas comunidades cariocas; e o daquelas que brigam na justiça para conseguirem dar continuidade ao tratamento com a maconha medicinal, que garante a manutenção e qualidade de vida dos filhos. Essa pesquisa feita a partir da observação participante nessa audiência pública e em contato posterior com movimentos sociais – com recorte na cidade do Rio de Janeiro (BR) – demonstra que apesar das diferenças socioeconômicas e do enfrentamento distinto, essas mães militam pelo mesmo fim: tornar o problema das drogas uma questão de saúde e não de segurança pública.
Palavras-chave: mães; guerra às drogas; ativismo; política de drogas; paradigma médico-jurídico.
Sessão 05: Debates contemporâneos em torno da maconha medicinal
17/07 (terça feira), das 14 às 15:30
Debatedor: Rogério Azize
Paciente ou usuário? A atualização das práticas de uso da maconha no Brasil a partir do cultivo caseiro
Autor: Yuri Motta/ Universidade Federal Fluminense
A partir de observações e entrevistas, trago dados etnográficos coletados em trabalho de campo que visam compreender a atualização das práticas de uso da cannabis no Brasil. Venho participando dos encontros de uma “associação canábica” na cidade do Rio de Janeiro, Brasil. Essa associação é sem fins lucrativos e tem o objetivo de auxiliar pacientes e seus parentes sobre a utilização de forma adequada para cada paciente a cannabis medicinal. No Brasil a lei permite apenas a importação do “óleo feito de maconha” usado pelos pacientes, representando uma dificuldade burocrática e financeira para adquiri-lo. Atuando na esfera pública, a associação busca interlocução com os operadores dos sistemas burocráticos, médico e jurídico, tentando se adequar aos aparatos estatais de controle, buscando assim a regulação do cultivo de cannabis no Brasil. Este artigo visa descrever minha relação com a associação e seus pacientes, assim como a relação da associação com seus pacientes, e de como o exercício de suas atividades contribui para a formação de articulações entre diferentes saberes.
Palavras-chave: maconha; paciente; cultivo caseiro; uso terapêutico.
O Artesanato da Legalização: apontamentos para um estudo sobre a atualização da chamada “cultura canábica” no Rio de Janeiro
Autor: Marcos Verissimo/ Instituto de Estudos Comparados em Administração Institucional de Conflitos, Brasil
O objetivo da presente proposta é colocar sob descrição uma série de práticas, ativismos e sociabilidades envolvendo o consumo de maconha. Como se sabe, tal consumo é proibido pelas leis brasileiras. Sendo assim, como se atualizam as formas utilizadas para continuar consumindo um produto proibido, derivado de uma planta na prática proibida de existir em boa parte do mundo? Para além disso, que mecanismos têm sido acionados por grupos que militam em prol da construção de aparatos legais não repressivos para regular tais práticas? O proponente é autor do livro “Maconheiros, fumons e growers: um estudo comparativo do consumo e do cultivo caseiro de canabis no Rio de Janeiro e em Buenos Aires”, resultado de seu estudo de doutorado, cujo trabalho de campo que o embasou ocorreu entre os anos 2010 e 2013. Desse modo, pretende-se através deste trabalho atualizar algumas questões levantadas no livro com base no trabalho de campo e na continuação da interlocução com agentes que atuam no campo do ativismo desde 2010 (ou mesmo antes) acrescida da inclusão de novos interlocutores e realidades no programa de estudos. As chamadas “growshops” (estabelecimentos comerciais onde se têm construído forte tolerância a consumos e práticas antiproibicionistas), bem como as associações e torno dos usos terapêuticos da maconha (uma das quais tenho tido a oportunidade de acompanhar os trabalhos), têm sido formas pioneiras na cidade do Rio de Janeiro para construir a atualização daquilo que entendem por “cultura canábica”.
Palavras-chave: regulação da maconha; práticas de consumo; usos terapêuticos; cultura canábica.
Interfaces beetwen law, justice and politics in cannabis therapeutic use in Brasil
Andrew Muller Reed/ Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Brasil
This paper approaches the knowledge and practices of parents of children who are impaired by rare illnesses, including seizures, around cannabis medical use. In great part thanks to the political pressure made up by relatives of patient, combined with judicial strategies to guarantee the access by right, recent changes in law regulation in the country officially permitted the importation and consumption of industrial medications made of cannabis. However, as the importation is very expensive, the parents expand their demand to the regulation of national production and the permission of homemade cultivation. Meanwhile, the patient’s dramatic and urgent condition force the families to follow illegal paths to access the remedy. Taking the assumption that the hegemonic perspective of the “State” as an unit entity covers an heterogenic set of powers, inclinations and positions, the research looks toward the relations subjects establish with state-owned administrative entities as the ANVISA (national agency of sanitary vigilance) and different instances of the judiciary, via juridical processes demanding the right to health. The social and political process of therapeutic marijuana use regulation arise questions about the classification of substances as drugs or medicaments, as well about the distinction between medical and recreational use that would be blurred or reinforced.
Palavras-chave: cannabis; drugs; therapy; justice.
O Judiciário e a atualização da política de drogas no Brasil: o caso da “maconha medicinal” e a construção jurídica dos usos da maconha
Autoras: Luana Martins e Lucia Lambert Passos Ramos/ Universidade Federal Fluminense, Brasil
A regularização do uso da maconha para fins medicinais é um tema que está em pauta no Brasil. Essa questão vem sendo discutida em diversos âmbitos, e a distinção entre este tipo de uso aponta para distintas formas de tratamento dos usuários pela sociedade. Esse debate ganha relevância a partir do ano de 2015, com a retirada do CDB, um dos canabinóides presentes na planta Cannabis, do rol de substâncias proibidas pela Anvisa. O judiciário, por sua vez, já concedeu alguns salvocondutos para que pacientes pudessem plantar maconha para a produção artesanal do óleo em suas residências, fabricando seu próprio remédio. Ao mesmo tempo, esse mesmo órgão aponta resistências, quando, por exemplo, pesquisadores da maconha são chamados pelo Ministério Público para depor por “apologia ao crime”. Nosso objetivo, então, pensando a partir desse cenário, e da heterogeneidade discursiva, é expor a maneira pela qual a categoria “uso medicinal” da maconha vem sendo articulada pelo judiciário para legitimar um salvo conduto para que uma pessoa possa ter a sua própria plantação de maconha. Buscamos pensar sobre as fronteiras tênues marcadas por termos como drogas e medicamentos, legal e ilegal, usos recreativo e medicinal e discutir como essas distintas categorias articuladas no âmbito dos processos relativos ao uso de maconha, mais do que meras categorias jurídicas que têm um significado específico para o direito e o processo, falam de uma moralidade que está associada a essas distinções.
Palavras-chave: maconha medicinal; usos; drogas; judiciário.